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CRISE HÍDRICA: MUITO MAIS QUE A FALTA DE ÁGUA

 

 

         A cidade de Juiz de Fora passou no ano de 2014 por uma de suas mais intensas crises de água. E nesse início de 2015 o quadro ainda não melhorou. Segundo a Companhia de Saneamento Municipal (Cesama), a Represa João Penido, principal manancial da cidade, está com 30% de sua capacidade. Na segunda semana de Janeiro o índice era de 34% devido as chuvas que vem acontecendo na região, mas ainda não é suficiente, já que no mesmo período de 2013, a represa estava com 90% de sua capacidade. Mesmo com estas porcentagens a Cesama decidiu manter o rodízio de abastecimento na cidade e pede para que os moradores consumam água com cautela.

 

            Com a Represa João Penido totalmente vazia, diversos outros aspectos começaram a assustar os moradores da região do bairro Náutico, Zona Norte da cidade. A Represa, que antes chamava a atenção por toda sua abundância, agora é cenário triste, com terra seca e animais pastando. Reinaldo Ferreira, caseiro do clube Náutico, mora no local desde o seu nascimento e relata que é a primeira vez que vê o manancial nesta situação: “É muito triste ver essa cena. Você acorda um dia e percebe que toda aquela água foi embora, e ninguém explica o que houve. A mais de 45 anos que isso não acontecia. E agora, vamos precisar de mais 45 pra que ela volte ao normal?”.

 

         Com a falta de água, o acesso às casas através da represa foi facilitado, o que obriga os moradores a ficarem mais atentos com os assaltos, como relata Fábio Rezende. “O pessoal entra pela represa, no fundo das casas, e a gente não tem como controlar. Eu tenho cachorros e também tenho acionado a polícia, que vem fazer ronda, mas mesmo assim os roubos continuam”.

 

          A região do Náutico é também conhecida por seus imóveis para alugar, e alguns deles possuíam um grande movimento devido a opção de ter a vista da represa e também a possibilidade de utilizá-la para lazer. Agora sem a água, os proprietários percebem a baixa do movimento. “A procura já não está tão grande como era. Muitos vinham pela opção de passear de lancha, mas agora não existe mais isso, não tem água”, esclarece Fábio. Segundo o morador, a diminuição do nível de água da João Penido estava perceptível: “Andamos monitorando durante meses e a água estava abaixando 30 cm por dia. Achamos que era uma falha da Cesama, pois preferiram esperar a chuva e ela não veio. Isso aqui está um crime ambiental”.

 

         Atualmente a cidade permanece em rodízio de abastecimento de água e as pancadas de chuva são a única esperança de se ter novamente os mananciais como eram antes. “Agora é esperar chover e rezar pra que ela fique igual estava antes. E que as pessoas aprendam que a água pode, sim, acabar”, reforça Reinaldo Ferreira.

 

ANO NOVO E ESPERANÇA DE CHUVA

 

            Apesar da chegada do ano novo, a situação do país em relação à falta de água permaneceu a mesma. Na cidade de Juiz de Fora, o mês de janeiro de 2015 foi um dos mais secos da história e a alta da temperatura também chamou a atenção. Já o mês de fevereiro começou com algumas precipitações que elevaram o nível de água das represas. Segundo a Cesama, a Represa João Penido estava com 29% de sua capacidade, passou a ter 33% e agora aumentou para 39%.  O prefeito Bruno Siqueira (PMDB), em entrevista à imprensa no prédio da Cesama, relatou sobre a possibilidade da represa João Penido secar e a importância da conscientização da população, confira aqui essas e outras informações.

 

 

LOCALIZAÇÃO E ASPECTOS GEOGRÁFICOS E SOCIAIS

 

           A represa João Penido é situada ao norte do município de Juiz de Fora e fica a cerca de 10Km da malha urbana. Por conta da criação do manancial na década de 30 do século XX, a região no entorno do lago ficou conhecida como Represa e abrange os seguintes bairros: Represa, Náutico, Taboporanga, Jardim Paraíso, Enseada Parque Ecológico.

 

         A região é marcada por contrastes sociais medidos pela distância do lago. As margens são tomadas por caras propriedades particulares cercadas por muros, mas o cenário se altera a medida que elas vão ficando para trás. As "granjas" à beira da água são um recanto bem valorizado e procurado por quem possui boa condição financeira e quer se afastar da cidade nos fins de semana e feriados. Em sua maioria, são casas não muito grandes, mas que possuem uma boa área externa. Os atrativos maiores, além da bela vista, são os passeios com pequenos barcos ou jet skis.

 

           Porém, nem tudo são sonhos de fim de semana nas proximidades de João Penido. Assim que você perde o espelho d'água de vista, a situação já muda. A Estrada Elias José Mockdeci é um dos únicos caminhos com calçamento nas proximidades, por isso é margeada durante boa parte de sua extensão por restaurantes, pousadas, clubes e granjas. As outras ruas e estradas são de terra e levam a casebres afastados uns dos outros.

 

           De segunda a sexta-feira, no geral, as granjas ficam vazias. Apenas caseiros, jardineiros e pedreiros são vistos nelas. Já pelas ruas de terra, é possível encontrar pessoas caminhando ou nos quintais das casas cuidando dos afazeres domésticos.

 

 

A REPRESA, AS PESSOAS E A SECA

 

        Todos sentiram a extensa e severa estação das secas em Juiz de Fora, mas quem sempre esteve próximo dos mananciais foram os que mais se assustaram com ela. Boa parte da área que o lago de João Penido sempre ocupou foi abandonada pelas águas.

          Ao chegar às antigas margens, o que se vê é uma paisagem desolada se estendendo por todas as direções, formada por lama preta, lixo e tocos de árvores.  A única água presente não estava represada: era o leito corrente do Ribeirão dos Burros, um dos cursos de água tributários da represa.

          Antônio Carlos Dalamura se aposentou, tornou-se vice presidente do Clube Náutico de Juiz de Fora, vendeu sua casa na cidade e agora mora com a esposa próximo a Represa.  O casal mora do lado menos nobre da rua, aquele que não tem contato com as margens e possui lotes mais baratos. Antônio frequenta o manancial há cerca de quinze anos e nunca viu o nível de água tão baixo como em 2014. "Nos outros anos era normal, baixava mas voltava, esse ano que está complicado".

 

Aperte o play e confira o trecho gravado da entrevista com o vice-presidente do Clube Náutico, feita pelos repórteres Tarcísio Henrique, Gustavo Sampaio e Bruno Fonseca.

 

 

         O Náutico é hoje um clube visivelmente decadente, com 80 sócios que pagam mensalidades de 30 reais para usufruir de instalações que sofrem com a falta de manutenção e a ação do tempo. Os prejuízos que a seca trouxe ao clube não foram pequenos, pois boa parte da renda vinha daqueles que frequentavam o local apenas para poderem colocar seus barcos e jet skis nas águas da represa.  Como administrador, Antonio se viu em um dilema: sem a chuva o futuro era incerto, mas com chuva os fregueses não saem de casa.

 

          O Sr. Sebastião Venâncio mora em uma área mais distante do lago. Em sua rua existem poucas moradias e nenhuma delas tem vista para as águas de João Penido. De trás da porteira de seu pequeno sítio, mantém uma boa prosa. Ele também nunca viu uma estiagem como a deste ano, apesar de morar na localidade há mais de 50 anos. Assistindo televisão e ouvindo rádio, Venâncio tomou conhecimento do descaso da maioria da população com a água e por isso se orgulha dos cuidados que tem com o pequeno curso de água que passa dentro de seu pedaço de terra.

 

 

       Tanto Venâncio como Antônio possuem poços artesianos em suas propriedades, prática comum na região. Os poços são caros e custam cerca de 5.000 reais atualmente, entre material e mão de obra. São usados para diversos fins, principalmente no abastecimento de piscinas e torneiras externas. Segundo informações da Cesama, esse tipo de intervenção deve ser notificado à Cesama, para que seja feita análise da água e a cobrança dos valores relativos.

            Em qualquer região da cidade, seja no centro ou na Represa, todos sentem o que acontece com o manancial responsável por 50% de toda a água consumida em Juiz de Fora. O desrespeito com a água em todos os ambientes, dentro de casa e na natureza, leva à essa situação pela qual passamos em 2014 e com a qual ainda sofremos em 2015. A visão do deserto de lama e lixo que virou a João Penido é impactante e serve de conscientização para o futuro.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fotos: Lilian Delfino

Entrevista - Antônio Carlos - Vice-presidente do Clube Náutico
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Um dos atrativos do Clube Náutico era o passeio de jetski, mas com o estado de seca da Represa João Penido, o deck encontra-se completamente vazio, assim como o  reservatório d'água.

A situação atual da represa João Penido faz com que o aviso na placa torne-se quase uma piada sem humor.

Imagens da Represa João Penido, em Novembro de 2014, revelam apenas um pequeno vestígio de água no local.

Fotos: Gustavo Sampaio

​© 2014 - Criado por Lilian Delfino e Lucas Gonçalves com Wix.com

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